Os desafios da era do lixo

16/04/2012 18:08

A urbanização trouxe progresso e melhorou a vida da humanidade, mas deixou muita sujeira pelo caminho. A questão de nosso tempo: o que fazer com o espantoso - e quase inevitável - volume de detritos das grandes cidades de modo a transformá-lo em riqueza.

Boa parte dos atos que a humanidade pratica cotidianamente sem pensar é seguida de outro gesto automático: sobrou, jogou fora. Assim, de latinha em latinha, de saquinho em saquinho, de caroço em caroço, de folha em folha, de caixa em caixa, de celular em celular, enfim, de resto em resto, um cidadão ocidental produz, em média, a cada ano, 500 quilos de lixo urbano. Um brasileiro é responsável por 378 quilos anuais. E, como lixo é lixo, ou seja, algo de que não se precisa e que não se quer ter por perto, ainda mais porque faz mal à saúde e ao planeta, governos, cientistas, indústrias e a população em geral empenham-se atualmente em encontrar formas de tratar a lixarada e reduzir sua quantidade - de preferência, ganhando dinheiro com isso.

O lixo, evidentemente, é tão velho quanto a humanidade. Nem sempre, porém, foi problema. Na pré-história, grupos nômades alimentavam-se da caça, da pesca e dos vegetais e os restos da refeição - ossos, peles e casca dos frutos - eram largados no solo e seguiam o ciclo natural, numa espécie de éden ecológico. Cada rajada de progresso desde então contribuiu para que os detritos aumentassem, sem que isso incomodasse muito as pessoas em volta (o asseio, em diversas sociedades, foi um conceito que custou a pegar). São muitas as ilustrações de Londres e Paris na Idade Média que mostram ruas emporcalhadas e dejetos sendo lançados das janelas sobre transeuntes incautos. Jean-Baptiste Debret, o retratista do Rio de Janeiro antigo, e outros artistas daquele tempo desenharam os escravos, chamados de tigres, que à noite transportavam em tonéis, nas costas, o lixo das casas e o despejavam no mar e em lagoas. A visão do lixo como problema a ser enfrentado só se firmou no século XIX, quando a Revolução Industrial instituiu um novo patamar de tecnologia, de conforto, de produtos - e de resíduos, montanhas de resíduos. O lixo, a partir daí, e empurrado pela comprovação científica de seu papel como causador de doenças várias, começou a ser um desafio para a humanidade. A industrialização incorporou ao cotidiano das pessoas uma série de novos produtos - e, mais que todos eles, o onipresente plástico, que, por demorar um século para se decompor e nunca desaparecer completamente, hoje enfeia ruas, praias, rios e até o fundo do mar. O impulso industrial também contribuiu para o surgimento das metrópoles - e, quanto mais gente confinada em determinado espaço, mais detritos se acumulam.

Na virada do século XIX para o XX, a limpeza urbana tornou-se uma preocupação séria. A primeira empresa desse segmento no Brasil, contratada pela cidade do Rio de Janeiro em 1876, era comandada por Aleixo Gary - seu sobrenome virou sinônimo de coletor de lixo. Em São Paulo, o primeiro contrato para coleta, limpeza de bueiros e incineração de lixo foi feito em 1893. Das carroças aos caminhões de coleta e aos caminhões-pipa, para lavagem das vias, décadas se passariam ainda. 

A acumulação de sujeira é inevitável, faz parte do mundo atual e não para de crescer e se multiplicar, com novos e problemáticos ingredientes. Às toneladas de garrafas, sacolas e embalagens de plástico descartadas todos os dias vieram se somar, mais recentemente, placas, teclados e outros componentes de computadores, impressoras, celulares e demais exemplares de uma nova categoria, o lixo eletrônico, ou e-lixo. Diante de tantos e tão variados detritos, muita gente está buscando meios de lidar com o que se joga fora. "O destino do lixo é a nova fronteira da evolução humana", diz Sabetai Calderoni, doutor em ciências pela Universidade de São Paulo (USP), pós-graduado em planejamento pela Universi¬dade de Edimburgo, na Escócia, e autor do livro Os Bilhões Perdidos no Lixo. "De agora em diante o homem tem de transpor esse obstáculo para progredir." À medida que soluções vão sendo pensadas, o lixo vai se transformando ele próprio num grande negócio. Empresas de coleta, tratamento e reciclagem, um setor já avançado nos países desenvolvidos e ainda incipiente, mas em franca expansão, naqueles em crescimento, como o Brasil, empregam milhares de pessoas e movimentam grandes quantias. Nos Estados Unidos, as empresas de coleta e tratamento de lixo urbano faturam 57 bilhões de dólares por ano.

 

Retirado do site: planetasustentavel.com